Porto & Legislação Destaque
Auditores do TCU querem retomada de leilão de terminal no porto de Santos
Parecer aponta irregularidades e prejuízos por atraso em licitação; ministério e autoridade portuária contestam
09/08/2024 13h59 Atualizada há 3 meses
Por: Colunistas Fonte: Folha de São Paulo
Divulgação APS

Relatório sigiloso da área técnica do TCU orienta que o plenário da corte de contas determine ao Ministério de Portos e Aeroportos a retomada da licitação do terminal STS10 no porto de Santos e levanta a hipótese de que a pasta tenha se esquivado da privatização ao delegá-lo à Autoridade Portuária (APS) para beneficiar grupos privados que operam no maior porto da América Latina.

Os técnicos mencionam danos ao erário de R$ 358,7 milhões pelo atraso de um ano e meio do leilão do terminal portuário. Os danos são contestados pelo ministério e pela APS. O valor foi estimado pela Antaq (Agência Nacional dos Transportes Aquaviários).

O caso está sendo relatado pelo ministro Jhonatan de Jesus e ainda não há previsão de julgamento pelo plenário. A Casa Civil monitora o processo diante do potencial de danos políticos para o governo.

O projeto do STS10 teve início em 2019, na gestão do então ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, para ser dedicado à movimentação de contêineres. A licitação estava prevista para 2022, por meio da consolidação de vários contratos vencidos -entre eles, o do Ecoporto.

No entanto, no início do governo Lula, o então ministro de Porto e Aeroportos, Márcio França , assinou um despacho decisório, suspendendo o fim do contrato do Ecoporto diante da desistência do governo de privatizar o porto de Santos.

Em setembro de 2023, França deixou a pasta e foi substituído por Silvio Costa Filho , que em vez de assinar uma nova prorrogação do contrato do Ecoporto, que venceria em junho de 2024, firmou um convênio com a Autoridade Portuária de Santos, delegando a ela poderes plenos -sobre contratos e até leilões.

Os técnicos do TCU afirmam que, desde então, o projeto do STS10 foi redefinido, graças à permanência do Ecoporto e da intenção de transferir o terminal de passageiros para a área.

Por isso, a orientação dada é de que o contrato do Ecoporto seja trocado por outro, de transição, com prazo de 180 -prazo considerado suficiente para que o terminal seja licitado.

Os auditores pedem ainda que o processo seja retomado em até um mês diante do que consideram "vício de iniciativa".

Os auditores consideram que houve potenciais irregularidades e danos ao erário tanto na delegação de poderes para a APS decidir sobre concessões quanto na prorrogação do contrato do Ecoporto.

"Os atrasos na implementação do projeto STS10 resultam em prejuízos significativos, uma vez que a demanda crescente não é atendida, criando déficits de oferta que afetam o nível de serviço e aumentam os preços contratados", escrevem os técnicos no relatório, obtido pelo Painel S.A..

"As simulações mostram que qualquer cenário de atraso no aporte de capacidade causará déficits substanciais na oferta programada para capturar a demanda entre 2026 e 2031".

No documento, eles sinalizam que as ações da APS têm sido orquestradas com o objetivo de inviabilizar o leilão do STS10.

A Casa Civil entrou dividida nesse jogo. Uma ala acha melhor destravar a licitação, mas outra prefere aguardar os desdobramentos do processo no TCU diante de potenciais danos na base de apoio do centrão ao governo.

O ministro Silvio Costa Filho é do Republicanos, partido de quem o governo Lula depende para navegar no Congresso. Pomini foi indicado por Márcio França (PSB-SP).

Consultado, o Ministério de Portos e Aeroportos informa que o cenário mudou e hoje não tem certeza se a concessão é a melhor saída para a expansão de capacidade do porto.

Mesmo assim, não descarta a licitação como possibilidade. No entanto, pediu até o fim de dezembro para apresentar uma solução final ao TCU.

Sobre os apontamentos específicos, o ministério disse que se pronunciará nos autos do processo.

Em resposta ao TCU, o secretário nacional de portos do ministério, Alex Sandro de Ávila, diz que os cenários de expansão dos terminais públicos e privados já existentes no porto, como DPW, BTP e Santos Brasil também devem ser adequadamente avaliados e, independente da escolha, não haveria danos ao erário.

"É de extrema relevância destacar que, em análises preliminares, verifica-se que há sinergia e similaridade de resultados em soluções distintas. Ou seja, seja o aspecto de se seguir com um novo leilão (STS10) seja a solução de expansão dos Terminais existentes, os resultados são similares", escreveu no ofício.

"Com um novo ativo por meio de leilão, sendo com uma expansão dos terminais existentes, o aumento de capacidade será, aparentemente, equivalente."

Além disso, ele informa aos auditores que a capacidade existente do porto de Santos somada às expansões já contratadas [dos terminais BTP e Santos Brasil], atenderá a demanda tendencial até o ano de 2034, com projeção de crescimento de 3% ao ano.

"Chama a atenção a manifestação isolada e repentina de um núcleo técnico do TCU sugerindo políticas públicas emergenciais ao Porto de Santos, tendo em vista que deixou de fazer a mesma exigência para os quatro anos anteriores ao atual", disse o presidente da APS, Anderson Pomini.

A autoridade informa que o porto opera com eficiência, atende a demanda, e que os projetos de expansão e os investimentos públicos e privados, em andamento, garantem a plena movimentação de cargas, inclusive contêineres.

Pomini afirma que, hoje, a APS, a prefeitura [de Santos] e o governo de São Paulo preparam a construção de dois viadutos e melhorias no sistema viário de acesso ao porto, exatamente na região onde foi proposto o STS10, que recebe mais de 4.600 caminhões por dia.

"Se o STS10 fosse implantado agora, outros 2.500 caminhões se somariam ao trânsito local por dia, paralisando Santos e o próprio porto", disse em nota.

No ofício enviado ao TCU, Pomini informa que a corte de contas já estava a par da versão revisada do STS10 por meio de uma nota técnica enviada em 2022 -antes que a APS assumisse a gestão completa do porto.

Alinhado com o ministério, ele também afirma que o STS10 não é a única alternativa para aumentar a capacidade de contêineres e defende que todos os cenários [para expansão da capacidade] sejam avaliados.

"O porto de Santos não deixará de atender a demanda de contêineres", escreve. "A capacidade existente e as expansões já contratadas atenderão a demanda projetada na próxima década."

Ele também refuta a projeção de dano ao erário ao longo de um ano e meio, desde que o STS10 entrou nos planos do governo para concessão.

"Na maior parte do referido interregno não houve questionamentos por parte do tribunal a respeito da já sabida paralisação do projeto do STS10 atrelado a um processo de desestatização do porto de Santos que à época já apresentava notórios indícios de inviabilidade", diz.