Os trabalhos para a reestruturação financeira do Grupo Safras seguem a todo vapor, em pleno fim de semana. Depois de se enrolar com uma dívida de quase R$ 2 bilhões, numa conta que inclui R$ 500 milhões herdados da aquisição da paranaense duas fontes. Na pauta, está um pedido de standstill de três meses, suspendendo o pagamento de dívidas até o fim de janeiro.
A companhia também quer um waiver dos detentores de CRAs da Copagri para evitar o pagamento da amortização que vence em 20 de novembro. A parcela do mês que vem era originalmente de R$ 18 milhões, mas metade já foi adiantada de forma voluntária em setembro, como um sinal de diálogo aos credores. Restam, portanto, R$ 9 milhões para amortização em novembro, um montante que será adiado se o waiver for concedido.
Do passivo de R$ 2 bilhão do Grupo Safras, metade está com credores financeiros — desse total, cerca de 10% está na mão dos detentores do CRA. As dívidas com os bancos (perto de R$ 900 milhões) constituem créditos mais simples, como descontos de duplicatas e linhas de capital de giro. O restante diz respeito aos fornecedores, incluindo agricultores que vendem os grãos para a companhia processar.
A reunião desta segunda-feira dá sequência às conversas conduzidas pela companhia com os credores ao longo das últimas semanas, desde que contratou a Makalu Partners como assessora financeira para a reestruturação.
Nesse diálogo, o Grupo Safras buscou dar mais transparência, discutindo caminhos para a continuidade do negócio. A abertura das conversas reverte a postura anterior do grupo, que ficou mais fechado à medida em que o caldo foi entornando.
O que é o Grupo Safras
Até o final de 2023, o Grupo Safras aparentava uma situação confortável. Com um faturamento da ordem de R$ 7 bilhões, a companhia operava de forma saudável, disse uma fonte ao Sob o guarda-chuva do grupo, estão três negócios: o Safras Armazéns — que originou o grupo, e é a maior divisão em receita —, Safras Bioenergia, com uma planta de etanol de milho, e a Safras Agroindústria, a antiga Copagri, comprada no final do ano passado, que consiste em um negócio de esmagamento de grãos.
Com esse modelo de negócio, aliando a originação de grãos ao processamento, o Grupo Safras buscava capturar margem ao longo da cadeia: o armazém origina soja e milho e essa originação alimenta a planta de etanol de milho e a soja que será esmagada para se transformar em farelo e óleo.
Uma das explicações mais relevantes para a crise é a própria aquisição da Copagri, uma empresa mais alavancada do que o restante do grupo e cuja integração foi um desafio — até mesmo pela distância física do management da Copagri, no Paraná, e o do Grupo Safras, no Mato Grosso.
Ainda assim, a aquisição sozinha não é suficiente para explicar o cenário atual. Existem outros fatores internos que podem ser levados em consideração. No fim de 2023, por exemplo, o grupo trocou o software de gestão, num processo que se revelou traumático.
A troca do ERP foi feita por uma consultoria pequena, que quebrou no meio do processo de transição de sistemas, provocando um caos de informação, apurou. Esse fator ajudou a causar uma desorganização financeira na companhia que, com menos controle, deixou de reportar informações financeiras, como o próprio balanço auditado. Em meio a essa desorganização, os bancos cortaram linhas de crédito.
Os avanços com os credores
Ao longo das últimas semanas, o diálogo com os credores rendeu frutos. Há disposição em encontrar uma solução para a companhia e existe também o reconhecimento, por parte dos credores financeiros, que se trata de uma empresa com bons ativos. Nas conversas, já foi discutido até mesmo a necessidade de o Grupo Safras conseguir alguma forma de liquidez para pagar os grãos adquiridos dos agricultores de forma mais ágil. Esse é um elemento importante na equação não só para dar fôlego financeiro aos fornecedores, mas principalmente para resgar a confiança, muito abalada.
Foi nas conversas com os credores, aliás, que a proposta do standstill até janeiro amadureceu. Atualmente, a maior parte da dívida da companhia com os bancos vence até o fim deste ano. Algumas instituições financeiras estudam conceder um alongamento ainda maior, de seis meses, disse uma fonte.
Os próximos passos
Após a conversa de segunda-feira, convocada pela — securitizadora que fez a emissão do CRA da Copagri, em 2022 —, deve ser convocada uma assembleia para os detentores dos títulos aprovarem a proposta de renegociação ainda na primeira quinzena de novembro. Não está nos planos do Grupo Safras dar um haircut explícito aos credores, e tampouco um plano de recuperação judicial ou extrajudicial. “O standstill é um remédio bem menos amargo que a RJ”, disse um credor. Mas mesmos sem um haircut explícito, a alongamento das dívidas inevitavelmente redundará em um haircut implícito, mas disso não há como escapar.
Nas negociações com os fornecedores de grãos — agricultores, em sua larga maioria —, a negociação segue sendo feita por um escritório de advocacia local, mas o Grupo Safras também já fez um gesto de boa-fé, disse uma fonte.
Um acionista da empresa colocou à disposição desses fornecedores um estoque de R$ 90 milhões em insumos agrícolas para pagar os produtores a quem deve. Até o momento, pelo menos 200 produtores já aceitaram uma negociação nesses moldes.
Em busca de parceiros
Com as dificuldades financeiras deste ano, a companhia encolheu as operações nas três unidades de negócio, o que foi
inevitável diante da demanda cavalar por capital de giro. Como resultado, os ativos do Grupo Safras estão operando com uma grande ociosidade, o que não é o melhor dos mundos.
Para superar esse problema, uma saída discutida em curtíssimo prazo é ceder parte da capacidade dos ativos para outra empresa usá-la, dividindo os lucros após a venda do produto final — seja ele farelo de soja, ou qualquer outro produto. Internamente, há otimismo com essa alternativa.