Lá se vão 133 anos desde que o vapor Nasmith aportou nos primeiros metros do cais do Porto Organizado de Santos. Mas a história do maior porto da América Latina começou bem antes, no início do século XVI, com naus lusitanas ancorando na Ilha de Guayaó, onde hoje é a Ponta da Praia, para depois encontrarem áreas estuarinas, mais calmas e seguras, onde hoje é o Centro Histórico de Santos.
Nas terras lindeiras surgiu o primeiro hospital do Brasil, o Hospital de Todos os Santos, em 1543, atual Santa Casa de Misericórdia de Santos. Ali se estabeleceram colonos e foi construído um dos primeiros engenhos de açúcar do país, o Engenho do Governador ou Engenho do Trato, depois Engenho dos Erasmos. Assim, o açúcar foi um dos primeiros, senão o primeiro produto de “exportação” do Porto de Santos.
Ali, em 1546, foi fundada a vila de Santos, herdando o nome do hospital.
Ao longo dos séculos, o porto e a cidade de Santos passaram por altos e baixos, até que no século XIX, graças ao café, ganharam protagonismo definitivo. Por aqui, além de importações e exportações, também chegaram milhares de imigrantes, que ajudaram a transformar São Paulo no estado mais pujante e desenvolvido da União.
A jovem República manteve o entendimento de que o porto precisava de infraestrutura e gestão modernas, transitando dos precários trapiches isolados para o cais dotado de armazéns, ferrovia e guindastes. Aliás, a ferrovia chegou bem antes, ainda no Império.
Depois, veio o saneamento básico, que livrou Santos da pecha de “porto maldito” e lhe deu sua principal referência urbana: os canais de drenagem.
Graças ao porto, foram construídos os principais acessos à Região Metropolitana da Baixada Santista - RMBS. E por conta dele, novos estão sendo projetados, de forma mais do que urgente. Antes tarde do que nunca, mas não precisa ser assim, e não é, na visão de países que entendem a importância da infraestrutura e da logística para seu desenvolvimento econômico e estabilidade social.
Nesse tópico, merece destaque especial a ligação seca entre as margens do Canal do Estuário:
Ao menos desde 1927 existe essa proposta, concebida como um túnel que previa inclusive a passagem de bondes elétricos.
O tempo passou, novos projetos e localizações foram estudados, mais no campo do discurso político, sem a objetividade que esse tipo de obra exige. Foi no final da década de 1990 que a então CODESP contratou estudos para a ligação entre as margens do canal, via túnel subaquático, nos moldes já existentes em outros países.
Na época, ainda não havia as Avenidas Perimetrais. Mas, o que o porto tem a ver com esse tipo de obra? Quem faz esse tipo de pergunta deveria verificar qual foi a motivação de outros portos do mundo já terem feito o mesmo!
Naquela época, sua execução pela iniciativa privada foi considerada inviável, considerando o CAPEX vis a vis do valor de pedágio considerado aceitável, em relação às travessias por balsas. Ainda não se fala muito em PPP.
O Governo do Estado retomou a ideia, no início da década de 2010, propondo uma parceria com o Governo Federal, que também não foi viabilizada, por falta de recursos da União. Os investimentos em obras no exterior já estavam fazendo falta por aqui.
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Foi quando a Autoridade Portuária de Santos resolveu retomar o projeto, prevendo sua execução com recursos próprios: um desafio!
Reconhecendo sua parcela de responsabilidade por uma obra que também é de mobilidade regional, o Governo do Estado buscou parceria com a União, desta vez bem sucedida, já com a iniciativa privada considerada no processo.
Mas o que o Porto tem a ver com o túnel?
Quem afirma isso deveria perguntar o que de fato é o problema que lhe aflige: por que investimentos básicos em infraestrutura portuária, que devem ser custeados com base na arrecadação tarifária, não atendem à demanda existente? Ou seja, a abordagem é sobre prioridades e não sobre pertinências.
Uma obra custosa e inédita no país é necessária há quase 100 anos, e tem como outro interesse a transferência de tecnologia. Porém, o “x” da questão sempre foi como custeá-la.
No caso do túnel, o interesse do porto, já demonstrado pelo estudo da década de 1990, que além de conectar as duas margens do complexo portuário, via Avenidas Perimetrais, está diretamente ligado à segurança de navegação e ao seu futuro.
O túnel reduzirá a demanda por travessias aquaviárias, tanto de veículos como de pedestres (segurança de navegação); e eliminará a única barreira aérea existente no porto, o “linhão” de Itatinga, que terá sua rede inserida na estrutura da obra.
Com isso, e associada à dragagem de aprofundamento prevista, já considerada na profundidade adotada para o túnel, o canal de navegação estará apto a receber navios de maior porte, bem como plataformas “offshore”, que poderão ser produzidas e mantidas por aqui, tendo a Usiminas como potencial parceira, também contribuindo para a criação de um parque industrial associado, com foco em alta tecnologia e exportações de maior valor agregado.
O Porto de Santos, por sua importância estratégica, pode e deve ser um polo de atração de empreendimentos e inovação!
De fato, além de sua incontestável importância no sistema portuário e, portanto, na economia nacional, o Porto de Santos sempre foi palco de inovações: primeira operação com contêineres, em 1965; implantação do primeiro "Corredor de Exportação", em 1973; o primeiro terminal especializado na operação de contêineres do Brasil, o TECON (atual Santos Brasil), em 1981, ainda o principal do País.
Prova dessa união siamesa entre porto e cidade, a tradição libertária e cosmopolita de Santos fez com que ela perdesse sua autonomia política, em 1968.
O final do contrato de concessão à pioneira Companhia Docas de Santos - CDS, em 1980, após 90 anos de concessão, coincidiu com crises econômicas e falta de capacidade de investimento da iniciativa privada, o que levou à estatização do porto, que passou a ser operado e administrado pelo Governo Federal, via Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP.
Os investimentos da União na expansão do Porto de Santos foram significativos. Em contrapartida, sua pujança sustentou investimentos em outros portos.
A persistência da crise econômica, a burocracia estatal, questões político-partidárias, as tensões decorrentes da globalização e a perda de capacidade de investimento do Governo Federal levaram ao início do processo de privatizações.
Os portos brasileiros entraram nesse processo pela Lei 8.630/1993, com o início do arrendamento de operações portuárias à iniciativa privada, em verdade um retorno. Esse processo incluiu modernização das instalações e operações, com impactos sensíveis, por vezes dramáticos, sobretudo na relação capital x trabalho. No entanto, a efetiva participação de todos os atores do sistema nos Conselhos de Autoridade Portuária - CAPs por ela criados, com caráter deliberativo, contribuiu para uma transição relativamente tranquila.
Nesse cenário, o Porto de Santos duplicou sua movimentação de cargas em cerca de 10 anos! E mesmo sem ampliar sua área, não para de bater recordes, também contando com a participação de Terminais de Uso Privado – TUPs, que se beneficiam de sua infraestrutura de acesso terrestre e aquaviário.
Os resultados positivos aqui alcançados o mantiveram como referência nacional, inclusive no âmbito da relação porto-cidade, consolidada com investimentos de operadores portuários em obras e serviços públicos municipais; com a participação da Prefeitura de Santos no Conselho de Autoridade Portuária de Santos, a partir de 2021; e, de forma emblemática, com a inauguração do Parque Valongo, em 2024.
Essa simbiose entre o porto e as cidades que o abrigam tornou a região destino ideal para novos empreendimentos, incrementando e diversificando a economia regional.
Novos terminais portuários; revitalização da área central de Santos; sede da UO-BS, da Petrobras; a viabilização do aeroporto regional, em Guarujá; consolidação do Porto de Santos como principal operação de cruzeiros marítimos; e a criação do Parque Tecnológico de Santos são alguns exemplos desse cenário de progresso.
No entanto, legislações posteriores à Lei 8.630 restringiam a criação de terminais privados. A imperícia e/ou lentidão no processo de obtenção dos licenciamentos também contribuíam para limitar ou adiar investimentos.
A Lei 12.815/2013 trouxe evolução, no que se refere a terminais de uso privado e concessão de portos à iniciativa privada. Porém, o mesmo não ocorreu em relação aos portos organizados, que tiveram seus conselhos de autoridade portuária reduzidos à condição de órgão consultivo, com as decisões centralizadas em Brasília.
Essa legislação está em fase de revisão, e espera-se que à recente delegação de competências à Autoridade Portuária de Santos – APS também seja agregada maior participação dos múltiplos atores locais e regionais: cidades, produtores e operadores logísticos na definição de estratégias de desenvolvimento e na atração de investimentos.
O Porto de Santos tem potencial para aumentar sua capacidade estática e dinâmica pelo adensamento e modernização de suas instalações, pela criação de novos terminais e pela implantação de atividades industriais, com foco em exportações, caso das Zonas de Processamento de Exportação – ZPEs. A proximidade do porto e do futuro aeroporto de Guarujá são inestimáveis trunfos logísticos a serem adequadamente explorados.
Há espaço para tanto na área continental de Santos, incluindo a Ilha dos Bagres, e em outras cidades da região. Esse arcabouço tende a consolidar cada vez mais nosso complexo portuário como concentrador multipropósito.
Mas isso não depende apenas do porto: ele é só um elo da cadeia logística!
De nada adianta ter um porto amplo e moderno se ele não for utilizado adequadamente; se tiver "gargalos logísticos"; se não dispuser de retroáreas; se não houver gerenciamento do fluxo de cargas; se não for ágil na liberação de mercadorias; se não houver silagem adequada, na origem; se ele provocar impactos urbanos negativos, atmosféricos ou viários e, sobretudo, se os licenciamentos ambientais e processos licitatórios não forem ágeis, atentos às demandas estratégicas do País.
Para tanto, é preciso que todos os atores participem do processo e façam sua parte, com projetos adequados, licenciamentos corretos, licitações e fiscalizações ágeis e idôneas! Revisar a legislação é fundamental nesse processo!
O Porto de Santos pode e deve operar cada vez mais cargas "amigáveis" e de maior valor agregado. Também precisa de estaleiros e de bases de apoio “offshore”, bem como de melhorias em suas matrizes de transporte e energia, em seus acessos terrestres e aquaviários.
São planos para um porto que completa 133 anos que, em verdade, são quase 500! Afinal, é impossível dissociar porto e cidade, cidade e porto, cuja relação sempre deve ser de mútuo respeito e colaboração.
Assim, ele permanecerá sempre jovem, com uma infinita capacidade de se reinventar, de superar desafios.
Parabéns, Porto de Santos!
Só não sopraremos velas - a não ser as do Cisne Branco -, pois hoje são outras as forças que movem as embarcações e o desenvolvimento!
E cantaremos teus "parabéns" em alto e bom tom, pois, calados, só comemoraremos os dos "post-panamax" e "super-size"!
Que o oceano seja o limite!
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