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Portuárias em Destaque Artigo Comemorativo

Temos um mar a ser conquistado

por: Shana Carolina C Bertol

08/03/2025 10h36 Atualizada há 22 horas
Por: Colunistas
Imagem Ilustrativa
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A cultura de masculinidade e patriarcado nos portos atravessa gerações. Antes da entrada em vigor da Lei de Modernização dos Portos (8.630/93), a profissão de trabalhador portuário avulso era transmitida de pai para filho. E se o filho fosse do gênero feminino, a indicação recaia sobre o genro. Olhando com os olhos do passado, esse ambiente predominante masculino se justificava pelo uso demasiado da força braçal para realização de embarque e desembarque de cargas nos portos. 

Com a evolução tecnológica da logística portuária e a criação de uma legislação específica dos portos, aquela emblemática figura do Jacinto, conhecido como “Sansão do cais Santista”, carregando vários sacos nas costas, e a transferência desta atividade de pai para filho, atualmente não existe na realidade dos portos. Mas a sombra do passado ainda assola a inclusão das mulheres no mercado de trabalho portuário.

Se o gap da disparidade de gênero global pode demorar mais 134 anos para ser eliminado[1], no setor portuário a realidade ainda é mais assombrosa. Segundo dados obtidos da UNCTAD - Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, apenas 18% das vagas no setor portuário global são destinadas as mulheres. Nos portos europeus, os números são mais animadores, sendo distribuída a participação feminina em 25% na média geral, 39% nos cargos de direção e 16% nos cargos operacionais.

 

A nível nacional, o levantamento de dados sobre equidade de gênero realizado pela ANTAQ - Agência Nacional dos Transportes Aquaviários[2], indica que a atuação das mulheres no setor portuário brasileiro não avançou no século XXI, permanecendo estagnada no mesmo percentual apurado no séc. XX, qual seja: 17%. De um total de 302 companhias entrevistadas, 16,7% das mulheres ocupam dos cargos de direção, 22,5% cargos de gerência e 16,4% desempenham suas atividades na área operacional.

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Para ingressarem no setor portuário, as mulheres precisam transpor uma barreira de cultura masculinizada na beira do cais e no centro das importantes tomadas de decisões.  O preconceito, machismo, falta de preparação de um ambiente de trabalho para receber mulheres e poucas políticas inclusivas, reforçam ainda mais esse muro da disparidade de gênero.

Um exemplo que este mercado ainda intimida muitas mulheres, é o processo de seleção do OGMO/Paranaguá para contratação de trabalhadores portuários avulsos para o exercício das atividades de estiva, arrumador, conferente e vigia. Do total de 7.415 candidatos inscritos, apenas 1.159 (15,64%) inscrições eram do sexo feminino.

Na busca por uma sociedade mais igualitária, os atores sociais do contexto portuário precisam intensificar programas como: ações afirmativas para acelerar a contratação de mulheres; transparência salarial (ganhamos cerca de 20% a menos que os homens); política de capacitação profissional para mulheres; política de combate ao assédio e outras formas de violência e discriminação; fortalecimento dos setores de compliance e instituição de canais de denúncia.

Algumas iniciativas de boas práticas vêm fazendo a diferença dentro do setor portuário:

· Selo Life concedido à empresa BTP – Brasil Terminal Portuário, por desenvolver iniciativas em prol da equidade de gênero e que fortalecem a presença das mulheres no ambiente portuário;

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·  Guia de Enfrentamento ao Assédio no Setor Aquaviário lançado pelo Ministério dos Portos e Antaq, em março de 2024;

· Programa Capacita +, desenvolvido pela Secretaria Municipal da Mulher de Paranaguá em parceria com o OGMO/Paranaguá, para capacitação de Mulheres para o mercado de trabalho portuário.

· Grupo Mulheres & Portos, constituído com o objetivo de incentivar mulheres portuárias e marítimas a ingressarem no setor portuário e seguirem suas carreiras.

A sombra do passado ainda é um desafio na construção de um porto onde mulheres tenham mais espaço e voz, mas o futuro é uma nova página em branco que depende não apenas de oferecer mais oportunidades, mas em acreditar que mulheres têm capacidade e competência para contribuir para o desenvolvimento dos portos.

[1] GLOBAL Gender Gap Report 2021. World Economic Fórum. Disponível em: https://www3.weforum.org/docs/WEF_GGGR_2021.pdf. Acesso em 06 março. 2025.

[2] Painel dos Resultados da Pesquisa de Equidade de Gênero. Disponível em: https://web3.antaq.gov.br/ea/peg/. Acesso em 06 março. 2025

  O conteúdo desse artigo é de responsabilidade do seu autor e não representa exatamente a opinião do JORNAL PORTUÁRIO.

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Shana Carolina C Bertol
Sobre Shana Carolina C Bertol
É diretora executiva do Ogmo/Paranaguá. Ela é advogada, formada em Direito pela Universidade de Marília/SP, com pós-graduação em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Unicuritiba, e possui MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.